"Quem é o senhor?"

São 10:00hs da manhã. Acabo de deixar minha esposa em seu trabalho e retorno para casa, onde irei dar andamento aos meus afazeres. Chegando na entrada do bairro que moro, deparo-me com uma cena inusitada: um grupo de rapazes instala placas de propaganda bem na frente do posto da Guarda Municipal, aos olhos dos policiais (ou guardas como eles querem ser chamados). Fico intrigado, pois seu que a Lei 14223/06 proíbe a instalação de placas de anúncios em São Paulo. Fico pensando comigo mesmo se, como cidadão, devo fazer algo. Dou uma volta no quarteirão e resolvo que se não posso arrumar o mundo, pelo menos posso arrumar meu bairro. Retorno e estaciono meu carro em frente ao posto da GCM. Sou atendido educadamente pelo GCM Sobral. Pergunto a ele qual o papel da GCM, pois como cidadão, tenho dúvidas. E engato logo em seguida: "O fato desse pessoal estar instalando material de propaganda bem na sua frente não caracteriza quebra da lei municipal e portanto vocês deveriam fazer algo?" Ele explica-me que o certo seria chamar a fiscalização da sub-prefeitura da Vila Mariana (3397-4100) e eles iriam acompanhar. Mas se eu quisesse, ele poderia chamar uma viatura e iríamos para uma delegacia fazer um BO. De pronto respondi: "Pode chamar. E vamos para a delegacia." O olhar surpreso fez com ele se entregasse e mostrasse entender que eu estava falando sério. Ao chamar a viatura, observamos que, não somente a empresa estava colocando cartazes, mas estava usando crianças para panfletar (as duas coisas ilegais). O GCM foi então falar com eles e solicitou que os mesmos retirassem as placas e entrassem em contato com os superiores deles, pois a viatura estava chegando e iríamos levá-los à delegacia. As crianças correram para dentro de uma Kombi e sumiram de vista. Uma outra Kombi ficou ostensivamente parada do outro lado do posto policial, tentando intimidar-me. Logo quem! A viatura chegou e abordou a Kombi que estava cheio de material de propaganda que seria instalado ilegalmente. Pedi que fôssemos ao stand de vendas da empresa que era algumas quadras dali. O CD Laurentino da GCM, solicitou que todas as placas fossem retiradas da localidade (Av. Fábio Prado) o que começou a ser feito pelo rapaz da Kombi (contrariado, é claro). Ao chegar no stand de vendas, fiquei abismado: era um stand da Tecnisa com vendas da Fernandez Mera, duas empresas conceituadas que deveriam saber que cumprir a lei é condição básica em uma sociedade. Além disso, a Tecnisa é uma empresa com capital aberto e responde a critérios rigorosos de governança corporativa, encabeçada por Carlos Alberto Julio, presidente da HSM, uma referência em treinamento em administração. Pedimos para falar com o responsável. Veio o segurança. Eu disse que gostaria de falar com o responsável e que ele não era. E recebi a pergunta fatal: "Quem é o senhor?", feita pela moça que se apresentou como responsável da Tecnisa. Aliás, a irmã dessa pergunta é também muito usada: "Sabe com quem está falando?" Respondi que era um morador do local e cidadão que estava cheio da impunidade e que estava exercendo meus direitos. E que iria até às últimas consequências para que aquilo (a propaganda ilegal e o uso de crianças na panfletagem) fosse interrompido. Telefonemas vão, telefonemas vêm e disseram-me que o Diretor Jurídico da Tecnisa estava chegando. Aguardamos por uma hora, quando chegou o Sr. Wilson Salmen, que se apresentou como responsável pela Tecnisa. Obviamente não estava com cara de muitos amigos, mas estiquei a mão e o cumprimentei. Começamos a explicar a situação, quando ele já engatou o discurso jurídico ensaido em muitas horas nas salas da reuniões da empresa: "O material não pode ser apreendido. Apenas uma multa poder ser aplicada. O material não estava fixo, estava na mão de pessoas." Disse a ele que ninguém estava apreendendo nada, somente estávamos ali para solicitar o interrompimento do não cumprimento da lei por eles e que parassem de usar crianças para fazer propaganda do empreendimento, bem como informar que as placas estava afixadas nas árvores. Ao pronunciar essa palavras, sua fisionomia mudou. Disse-me que se estavam pendurando as placas e usando crianças para panfletagem, isso era ilegal e que eu tinha razão. É óbvio que eu tinha razão. E eles sabiam disso desde o dia que autorizaram a campanha, muito antes de me conhecer. Só não contavam que iriam me conhecer. Ele solicitou que a propaganda fosse retirada, mas que iria usar pessoas para segurarem as placas, aproveitando uma brecha na lei. Mas isso é problema para outro capítulo. À propósito, Sr. Wilson, se isso for ilegal, iremos reclamar, também, afinal a lei não foi feita para ser apenas cumprida ipsis literis, mas também em seu conceito. As placas foram retiradas e nossa cidade foi protegida. Nossos direitos, também. E eu sinto-me bem, por não ser mais um que só fica reclamando e não faz nada. Faça isso, você também, exerça sua cidadania. Não importa "Quem é o Senhor ou a Senhora". Ou então, da próxima vez que alguém invadir sua casa, cale a boca, pois quem deixa alguém invadir a "casa de todos", não tem moral para reclamar da invasão da sua. Carpe Diem.

Comentários

Anônimo disse…
Evandro,

Lendo a história, lembrei-me de um dito: "quem protege os lobos, mata as ovelhas".

A postura de não ter receio perante o correto é cidadania, e você a exerceu plenamente.

Parabéns pela atitude com as ovelhas!
N.M. disse…
Cartões corporativos. Escreva sobre eles. Obrigada,

Nayara

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